terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Todo dia.

Afinal, somos todos criadores...

Olho para a folha de papel em minhas mãos, vazia. Tento em vão escrever meia duzia de letras organizadas, mas após horas fitando aquelas linhas azul-claras sem preenchimento, acabo por desistir.

"É, talvez eu não consiga mais criar"

Dois segundos. É o tempo que demoro para esbofetear-me mentalmente por tais palavras.
Crio todo dia. Criamos todo dia. Segurando o papel vazio percebo que este por si só é uma criação minha. Olho-me no espelho e percebo que sou minha própria criação. As cores, os sons, os gostos, texturas, cheiros... criei tudo isso, meu mundo.

Paro e penso. Se criei tudo isso, por que não teria criado a vocês? A eles, a ti, a nós. Em meu mundo, são vocês aquilo que eu criei, aquele amontoado de partículas perdidas no universo, que em minha cabeça organizei de forma a percebê-los como um ou outro ser, cada qual com sua importância neste meu mundo que mesmo sendo uma visão egoísta, está em harmonia com o mundo que vocês criaram.

Harmonia, é isso. Pego o violão e vejo as cores, ouço os sons, sinto os gostos, texturas, cheiros que criei. Entendo agora que na verdade, aquilo que meus dedos e cordas vocais expressam não são criações minhas neste mundo, e sim reflexões do mundo que criei.

Levanto-me, vou à janela e a luz me abraça. É isso, a prova de que precisava! Não há luminosidade alguma dentro de minha cabeça, ainda assim, meu cérebro criou do escuro esse mundo brilhante e cheio de vida.

Sento-me por fim em minha cama, olho para meus livros, e de longe avisto um no qual vi a frase que carrego comigo todo santo dia, e que me fez começar a procurar entender esse mundo que fiz.

"No fundo, todos nós inventamos o ser que amamos, e é uma questão de sorte esse ser que julgamos ter inventado existir de verdade e nos amar também, e nos ter inventado, como, de fato, eu continuo inventando você todo santo dia, para que não se apague, para que não se precipite no abismo do nada, onde as vozes não têm som."

E assim dormi tranquilo, sabendo que amanhã poderia acordar para o mundo que eu criei, e que sim, talvez o mundo possa ser como eu quero que seja, basta que nossos mundos, notas separadas, criem afinal aquela bela harmonia, e preencham a folha de papel vazia em minhas mãos.

domingo, 8 de fevereiro de 2009

Escadarias [2]

E construí cada degrau com cuidado e afinco, poli todas as superfícies e as lustrei, com o cuidado de um artesão. Ah! que trabalho prazeroso! Desenhar pouco a pouco aquela escadaria que me levaria ao que me é essencial.

Nenhuma falha, ou acúmulo de tensões, apenas brilho, beleza... A escada estava pronta, bastava subir.

Passo a passo, lentamente meus pés subiram aquela bela estrutura, passo a passo me levando a patamares mais altos, passo a passo abrindo um sorriso em meu rosto, inesquecível.

Leva-me às alturas, me faz olhar para baixo e nada ver. Consigo apenas olhar para cima, e para os muitos degraus que me chamam.

Qual não é minha surpresa, quando num passo em falso escorrego, e sinto aquela escadaria tremer... tremo junto.

Degrau por degrau, vejo o começo da escada ruir, e corro desesperadamente para o fim, sem perceber que meus pés, cheios de lama, sujam agora toda a escadaria com tanto esforço construída, com tanto esmero polida, e com tanto amor lustrada.


Corro pois não posso cair. Caio pois não sei correr.

Basta agora parar e olhar de frente cada degrau desmoronar, esperando que talvez o pouco que sobre me permita ainda escalar, dolorosa e cegamente, traçando novamente aquele tortuoso porém belo caminho.



Boa, engenheiro!